Ex-PM confirma que policial reformado Ronnie Lessa assassinou Marielle Franco e Anderson Gomes

Marielle

Em delação premiada à PF, Élcio Queiroz (centro) admitiu a participação dele, de Ronnie Lessa (à esquerda) e do ex-bombeiro, conhecido como Suel, no crime/Reprodução

Maxwell Simões Corrêa, o Suel, chega a sede da PF, no Centro do Rio/Gabriel de Paiva / Agência O Globo

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, durante coletiva na qual detalhou a operação da PF/Reprodução

Marielle Franco e Anderson Gomes foram assassinados na noite de 14 de março de 2018/Reprodução

O ex-bombeiro foi preso em casa, no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste do Rio/Reprodução

O ex-policial militar Élcio Queiroz admitiu, em delação premiada à Polícia Federal (PF), a participação dele, do ex-policial reformado Ronnie Lessa e do ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, o Suel, na morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. A informação foi divulgada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, que concedeu coletiva de imprensa na manhã desta segunda-feira (27/4) ao lado do diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, e do diretor do Sistema Penitenciário Federal substituto, Renato Vaz. Em depoimento já homologado pela Justiça, Élcio confessou a participação no assassinato e detalhou a ação criminosa.

Preso desde 2019, Élcio confirmou que dirigiu o carro usado no ataque. E disse que
Ronnie foi o responsável pelos disparos de submetralhadora contra Marielle.
“Tivemos uma delação, uma colaboração premiada, do senhor Élcio Queiroz – como
todos os senhores sabem, há alguns anos, essa investigação gira em torno desses
dois personagens: Ronnie e Élcio. Nessa delação, o senhor Élcio revelou a
participação de um terceiro indivíduo, que é o Maxwell, e confirmou a participação
dele mesmo e do Ronnie Lessa”, afirmou o ministro Dino.

Prisão de Suel
O ex-bombeiro, conhecido como Suel, acabou preso pela manhã, emsua casa no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste do Rio, durante a Operação Élpis, a primeira deflagrada pela PF sobre os assassinatos ocorridos em 2018. Além
da prisão preventiva de Maxwell, outros sete mandados de busca e apreensão
foram cumpridos na cidade do Rio de Janeiro (RJ) e Região Metropolitana.

De acordo com Dino, o depoimento conclui esta fase da investigação, “com a
confirmação de tudo o que aconteceu na execução do crime”. No entanto, segundo
o ministro, há, “sem dúvidas, a participação de outras pessoas”.
“Os alvos da busca e apreensão estão relacionados à delação premiada do Élcio.
Ou seja, a busca e apreensão, provavelmente, ao longo das próximas semanas,
resultará na produção de novas provas, de confirmação da delação e também da
indicação do próximo passo da investigação”, prosseguiu o ministro.

Intermediador entre mandante e assassinos

Marielle e Anderson foram executados a tiros na noite de 14 de março de 2018, na
região central do Rio, após um carro emparelhar com o veículo onde eles estavam e
disparar 13 vezes.

O inquérito nunca foi concluído. A polícia desvendou apenas parte do crime – os
mandantes e a motivação do assassinato continuam desconhecidos.

Quando assumiu o ministério, em 2 de janeiro, Dino disse que desvendar os dois
assassinatos era questão de honra. Em fevereiro, a PF entrou na investigação, em
parceria com o Ministério Público do Rio e a Polícia Civil.

Élcio Queiroz apontou mais um participante do duplo assassinato. Edimilson Oliveira da Silva, conhecido como Macalé, teria sido responsável por intermediar o contato entre os mandantes e os assassinos.

Edimilson era sargento reformado da Polícia Militar e foi executado em novembro de 2021, aos 54 anos. Segundo testemunhas, dois homens em um carro branco
atiraram contra Macalé na região de Bangu, na Zona Oeste do Rio.

“Inclusive foi através do Edimilson que trouxe… vamos dizer, esse trabalho para
eles; essa missão para eles foi através do Macalé, que chegou até o Ronnie”,
afirmou Élcio na delação.

De acordo com Élcio, Macalé ainda teria feito “campanas” para vigiar Marielle nos
dias anteriores ao assassinato. No momento da execução, Macalé estava com uma
pistola Glock, calibre 45. Nem a arma nem os documentos do policial foram
roubados na ação.

Delator afirma que soube apenas no bar que Marielle e Anderson haviam sido assassinados

Só na televisão de um bar na Avenida Olegário Maciel, na Barra da Tijuca, onde se
encontraram com um grupo de pessoas, entre elas o ex-bombeiro Suel, e após
atirarem contra o carro de Marielle e Anderson, na noite do dia 14 de março de
2018, Élcio Queiroz teria visto uma notícia e identificado o veículo da ex-vereadora.
Perguntou ao garçom o que havia acontecido e recebeu a informação de que era
sobre o homicídio de uma vereadora, que duas pessoas haviam morrido.

A descrição faz parte da delação feita por Élcio à Polícia Federal. No documento, ele
revela ter suspeitado apenas da morte de Marielle e que, como o vidro do carro
onde ele estava era muito escuro, não conseguia saber exatamente se Anderson
havia sido atingido também.

“Ficava toda hora aparecendo a chamada (televisão). Eu falei: o que aconteceu?
perguntei pro garçom, aí ele falou que foi um homicídio de uma vereadora, falou por
alto. Não tinha som porque estava tendo jogo. De vez em quando chamava, até que
um momento…pergunta, pergunta…até que ele falou: “morreram duas pessoas no
local”…eu falei: “que merda”. […] Veja bem, eu acredito que o vidro não estilhaçou,
não. O vidro estava fechado, eu nem vi o rosto dele. Não sei se o meu vidro era
muito escuro, pode ser que o disparo atravessou o vidro, mas eu não vi”, explica
Élcio na delação.

O delator contou que não conhecia Marielle. Ele era amigo de infância de Lessa e,
naquela noite, havia sido chamado por ele para dirigir um carro, mas não sabia
exatamente para quê. Élcio explicou que só entendeu que se tratava de uma
execução quando chegaram próximo à Casa das Pretas, na Lapa, Centro do Rio,
onde a vereadora participava de um evento, e Lessa vestiu um casaco, pegou uma
metralhadora, silenciador, binóculo e se arrumou no banco do carro.

Élcio de Queiroz está preso há quatro anos suspeito de participar das mortes da
vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. No dia 14 de junho, ele
fez uma delação premiada, na qual assumiu a participação no crime e deu detalhes
sobre a noite dos assassinatos.

Delação aponta que Ronnie Lessa e ex-bombeiro Suel faziam parte de milícia em
Rocha Miranda, subúrbio do Rio

Ronnie Lessa e o ex-bombeiro Suel integravam milícia em Rocha Miranda, na Zona Norte do Rio, onde os dois recebiam dinheiro com gatonet. A informação foi fornecida por Élcio de Queiroz em delação feita à Polícia Federal.

De acordo com o delator, a milícia exercia poder sobre a comunidade de Jorge
Turco, localizada entre os bairros de Coelho Neto, Colégio e Rocha Miranda. A
divisão do local era feita assim: “todo asfalto que não é comunidade, é do Suel. […]
Todas as ruas ali, algumas favelinhas, abaixo da comunidade é do Suel. A maior
parte é do Suel”; já a menor, mais adentro de Jorge Turco, era de Lessa.

Élcio descreve Ronnie Lessa como tendo “boa situação financeira”. De acordo com
o delator, o suspeito recebia dinheiro com quiosques em uma favela de Manguinhos,
recebia mensalmente com gatonet e também tinha renda com máquinas caça-
níqueis.

Ronnie Lessa e Suel se conheceram em Rocha Miranda, área onde ambos serviam
como agentes de segurança: Lessa como policial militar do 9ºBPM, e Suel como
bombeiro. Os dois viraram amigos e mantinham milícia na região.

Despesas pagas por Suel

Ainda na delação, Élcio Queiroz afirmou que suas despesas com advogado eram
pagas peo ex-bombeiro Suel. Depois de sua prisão, em 2019, ele afirmou que
passou a receber cerca de R$ 10 mil por mês para pagar as despesas com o
advogado de defesa. O dinheiro era repassado a Ronnie por Suel, segundo o
depoimento. Metade do valor era destinado a ajudar Élcio, que “estava passando
necessidade”.

“Eu não tinha contato com ele [Suel], quem tinha era o Ronnie. Só que o Ronnie
falava que como tinha esse dinheiro que vem pra ele todo mês, ‘faz o seguinte: uma
parte iria pagar as mensalidades do advogado, e o outro [sic] você fica pra você, pra
te ajudar”, disse Élcio.

De acordo com a investigação, o advogado de Élcio foi escolhido por Ronnie Lessa.
Os dois eram amigos e atuavam juntos em atividades ilícitas. Segundo Élcio, tinham
uma relação de “irmãos”.

O arranjo financeiro, conforme o depoimento de Élcio, durou meses. Suel também
chegou a enviar dinheiro para pagar a escola dos filhos do ex-PM.

Aos investigadores, Élcio afirmou que Suel parou de repassar o dinheiro há mais de
um ano. Primeiro, os valores foram diminuindo até cessarem por completo.

Evolução patrimonial de Ronnie após os assassinatos
Em sua delação, Élcio afirmou que deixou de acreditar na versão de Ronnie de que
ele não teria recebido dinheiro para realizar o assassinato ao perceber, depois do
crime, uma evolução patrimonial por parte do colega.

Segundo Élcio, depois do assassinato, Ronnie comprou uma picape blindada, uma
lancha nova, além de um terreno em Angra dos Reis, onde estava construindo uma
casa.

“Cara, eu (Ronnie) tenho dinheiro para fazer essa casa e fazer a da Barra, dinheiro
eu tenho para as duas”, Ronnie afirmou a Élcio, conforme a delação.

Por que Élcio de Queiroz decidiu fazer delação após 4 anos preso

O ex-PM Élcio foi convencido a fazer uma delação premiada após desconfiar de Ronnie Lessa, apontado como ser o seu comparsa no crime. Os dois estão presos em Rondônia e vão a júri popular pelas execuções.

Apontado como o autor dos disparos, Lessa teria dito ao comparsa que não fez pesquisas sobre Marielle. Após desdobramentos do caso, Élcio descobriu que o amigo mentiu, que polícia encontrou rastros da pesquisa e, com a quebra da confiança, decidiu fazer a delação, de acordo com a Polícia Federal.

“O convencimento do Élcio (para delatar) foi porque o Ronnie garantiu que não tinha feito pesquisa em Marielle e isso gerou uma desconfiança por parte de Élcio”, disse o delegado Jaime Cândido, da Polícia Federal, durante entrevista coletiva nesta segunda-feira (24).

No documento, Élcio é questionado várias vezes se sabia de alguma pesquisa prévia a respeito da vítima, Marielle. Ele responde que não tinha certeza.

No depoimento, ele revela que os dois ficaram aguardando a vítima na saída da Casa das Pretas, e que Ronnie Lessa apontou quem era Marielle.

A pesquisa para chegar até o local, de acordo com Élcio, foi feita no Instagram da própria vereadora, que divulgou o evento naquele dia, 14 de março de 2018.

“No momento que ela saiu, ele falou: ‘É ela’. Aí ela deu a volta, só que ela fala com uma pessoa. Eu achei que essa senhora estava se despedindo dela. Mas não, só que essa pessoa entrou no carro”, relatou Élcio.

“Achei que ia abortar a missão, mas ele falou pra ficar tranquilo que não ia pegar nela não, ele me tranquilizou.”

No carro, estavam a vereadora, o motorista Anderson e a assessora Fernanda Chaves, que sobreviveu.

Élcio disse que Lessa sabia exatamente quem era Marielle, mas não sabia qual era o veículo ou se ela andava com algum motorista.

“Não, do veículo não sabia, ele não falou nada não; ele desconfiou porque o cara estava em pé ali na porta com o celular, ele achou que era aquele veículo ali”, contou.

No depoimento já homologado pela Justiça, Élcio confessou que dirigiu o Cobalt prata usado no ataque e afirmou que Ronnie de fato fez os disparos com uma submetralhadora contra Marielle.

Élcio disse ainda que o ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, o Suel, fez campanas para vigiar a vereadora e participaria da emboscada, mas acabou trocado por ele. (Com informações do g1)